Category Archives: Estudos Bíblicos

O destruidor do povo de Deus

Oséias é o maior poeta do amor de Deus. Foi o único profeta escritor de Israel, o Norte. Por vinte anos (aproximadamente 750 a 730 a.C.), ele advertiu o povo de Deus do risco da destruição. Oito anos após sua morte, o Norte foi levado cativo e desapareceu. Ficou apenas Judá, o Sul. O Israel de Esdras, Neemias, Ageu, Zacarias, Malaquias e do Novo Testamento é o Judá retornado. O Israel de Oséias acabou. Foi destruído por falta de conhecimento.

“Porque lhe falta o conhecimento”, disse Deus. “Conhecimento”, aqui, não é erudição ou informação. Também não tem a ver com analfabetismo. O termo hebraico é daat, que significa “conhecimento íntimo, pessoal, profundo”, conhecimento relacional. Oséias viveu esta experiência em casa. Sua esposa, Gômer, o deixou. Tornou-se meretriz num culto pagão, que divinizava a natureza e tinha sacerdotisas prostitutas que se entregavam, no templo da Deusa, para trazer fertilidade à terra. Gômer não entendia o amor do marido. Ele a resgatou no templo pagão e a trouxe para casa. Ela não tinha daat e por isso destruía sua vida. Ela não o amava.

Muitos cristãos não têm daat. Amam seus gostos, não Deus. Gostam de festa, de culto com “fogo puro”, como dizia uma placa na porta de uma igreja (que tolice!) e de alarido. Mas a vida não mostra daat de Deus. Não exibe frutos de quem se relaciona com ele. Passando por Brasília, adquiri o “Jornal de Brasília” (28.5.12). A manchete era “Pregando na cadeia”, mas não alude a evangelismo na prisão. Alude à prisão do ex-deputado distrital Junior Brunelli, da famosa “oração da propina”, que correu pelo Youtube. Nela, o deputado agradecia o dinheiro vindo da corrupção, como sendo uma “bênção de Deus”. O ex-deputado e agora presidiário é pastor. Não me anima falar contra a igreja dos outros. Mas não me calo quando jogam o nome de Jesus na lama. Brunelli foi preso na “Operação Hofini”, nome do filho corrupto do sacerdote Eli. Ele também enlameou o nome de sua igreja. Com ironia, o jornal fala da igreja como sendo “propriedade da família de Brunelli”. Ela prega bênção e cura. Inclusive chama-se “Casa da Bênção”. Mas seu pastor não pregou caráter. Um crente em Jesus tem caráter.

O evangelho prega a transformação da pessoa. De alguém perdido a alguém salvo por Jesus, que mostra isso na vida. O evangelho não chama o convertido à riqueza, mas à santidade: “A vontade de Deus para vós é esta: a vossa santificação…” (1Ts 4.3). Os cristãos estão ouvindo mensagens mais para Lair Ribeiro que para Jesus Cristo. Assim, sobram-lhes palavras de ordem e lemas triunfais. E falta-lhes daat. Sem relacionamento pessoal e profundo com Deus, eles se destroem. E desonram a Jesus. Isto é o mais trágico. “Pois, como está escrito, por vossa causa o nome de Deus é blasfemado entre as nações” (Rm 2.24).

Busquemos daat, e não bênçãos. Bênçãos ele dá porque ele é bom. Caráter nós cultivamos. E devemos fazê-lo para honrá-lo com nossa vida.

Pr Isaltino Gomes

Plenitude ou Embriaguez? Efésios 5.18

Seria impossível exagerar a importância que o Espírito Santo exerce em nossa vida: Paulo já falou que somos selados pelo Espírito (Ef 1.13,14) e que não devemos entristecer o Espírito (Ef. 4.30). Agora, ele ordena que sejamos cheios do Espírito (Ef. 5.18). É o Espírito quem nos convence de que pecamos. É ele quem opera em nós o novo nascimento. É ele quem ilumina o coração para entendermos as Escrituras. É ele que nos consola e intercede por nós com gemidos inexprimiveis. Ele testifica com nosso espírito que somos filhos de Deus. É ele quem habita em nós.

Todavia, é possível ser nascido pelo Espírito, ser batizado com o Espírito, habitado pelo Espírito, selado pelo Espírito e, ainda assim, estar sem a plenitude do Espírito.

A questão levantada pelo apóstolo é: embriaguez ou enchimento do Espírito? Ele faz uma comparação entre a embriaguez e a plenitude do Espírito.

Vejamos, em primeiro lugar, a semelhança superficial. Quando uma pessoa está bêbada, dizemos que está sob a influência do álcool; e, com certeza, um cristão cheio do Espírito está sob a influência e o poder do Espírito Santo. Em ambas proposições, há uma mudança de comportamento: a personalidade da pessoa muda quando ela está bêbada. Ela se desinibe; não se importa com o que os outros pensam dela. Abandona-se aos efeitos da bebida. O cristão cheio do Espírito entrega-se ao controle do Espírito, e sua vida fica livre e desinibida.

Em segundo lugar, o contraste profundo. Na embriaguez, o homem perde o controle de sei mesmo; no enchimento do Espírito, ele ganha controle de si, pois o domínio próprio é o fruto do Espírito. Dr. Martyn Lloyd Jones, médico e pastor, disse: “O vinho e o álcool, farmacologicamente falando, não são estimulantes, mas depressivos. O álcool sempre está classificado na farmacologia entre os depressivos. O álcool é um ladrão de cérebros. A embriaguez, deprimindo o cérebro, tira do homem o autocontrole, a sabedoria, o entendimento, o julgamento, o equilibrio e o poder de avaliar as coisas. Em outras palavras, a embriaguez impede o homem de agir de maneira sensata. O que o Espírito faz é exatamente o oposto. Ele não pode ser posto num manual de farmacologia, mas ele é estimulante, antidepressivo. Ele estimula a mente, o coração e a vontade.

Em terceiro lugar, o resultado oposto. O resultado da embriaguez é a dissolução (asotia). As pessoas que estão bebadas entregam-se a ações desenfreadas, dissolutas e descontroladas. Perdem o pudor e a vergonha. Trazem desgraças, lágrimas, pobreza, separação. A palavra grega asotia envolve não apenas a ação descontrolada do homem bebado, mas também a ideia de desperdício.

 

Os benefícios do enchimento do Espírito Santo

O apóstolo Paulo fala sobre 3 benefícios da plenitude do Espírito:

 

a) Comunhão (Ef 5.19 a) –  […] falando entre vós com salmos. Isto nos fala da comunhão cristã. O cristão cheio do Espírito Santo não vive resmugando, reclamando da sorte, causando intrigas, cheio de amargura, inveja, ressentimento; sua comunicação é de elevo espiritual para a vida do irmão (Sl 95.1).

b) Adoração (Ef 5.19 b) – “Cantando hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando ao Senhor no coração”. Note que aqui o cântico não é entre vós, mas, sim, ao Senhor. Não é uma adoração fria, formal e sem entusiasmo. O cristão cheio do Espírito Santo adora a Deus com entusiasmo e profunda alegria. Ele usa toda sua mente, emoção e vontade para adorar a Deus. Um culto vivo não é carnal e nem morto. O culto verdadeiro é em espírito e em verdade.

c) Gratidão (Ef. 5.20) – “E sempre dando graças por tudo a Deus, o Pai, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo”. O cristão cheio do Espírito não está cheido de queixas e murmurações, mas de gratidão. Embora o texto diga que devemos sempre dar graças por tudo, é necessário interpretar corretamente esse versículo.  Não podemos dar graça por tudo, como pelo mal moral. Por exemplo: a esposa deve louvar a Deus pelo adultério do esposo, ou louvar a Deus pela embriaguêz do marido, ou louvar a Deus pela perda do filho nas drogas, ou mesmo na morte.  Dr. John Stott, ilustre expositor bíblico, diz que o “tudo” pelo qual devemos dar graças a Deus deve ser qualificado pelo seu contexto, a saber, “a Deus, o Pai, em nome do nosso Senhor Jesus Cristo”. Nossas ações de graças devem ser por tudo que é consistente com a amorosa paternidade de Deus e com a revelação de si mesmo que nos concedeu em Jesus Cristo. Amém!

Pr Marcelo de Oliveira

Bibliografia: Lopes, Hernandes Dias. Efésios.Editora Hagnos.

                    Stott, John. A mensagem de Efésios. Editora ABU

                    Wiersbe, Warren. Comentário Expositivo. Geográfica Editora.

 

 

Pedro foi bispo de Roma ?

A Bíblia não tem nenhuma palavra sobre o bispado de Pedro em Roma. A palavra Roma aparece nove vezes na Bíblia, e Pedro nunca foi mencionado em conexão com ela. Não há nenhuma alusão a Roma em nenhuma das epístolas de Pedro. O livro de Atos nada mais fala de Pedro depois de Atos 15, senão que ele fez muitas viagens com sua mulher (1Co 9.5). A versão católica Confraernity Version traduz esposa por irmã, mas a palavra grega é gune, e não adelphe.

Não há nenhuma menção de que Pedro tenha sido o fundador da igreja de Roma. Possivelmente os romanos presentes no Pentecostes (Atos 2.10,11) foram os fundadores da igreja de Roma.

No ano 60 d.C., quando Pedro escreveu sua primeira carta, não estava em Roma. Pedro escreveu essa carta do Oriente e não do Ocidente. Estava na Babilônia, e não em Roma (1 Pe 5.13). Flávio Josefo diz que na província da Babilônia havia muitos judeus.

Paulo escreve sua carta à igreja de Roma em 58 d.C. e não menciona Pedro. Nesse período, Pedro estaria no auge do pontificado em Roma, mas Paulo não dirige sua carta a Pedro. Ao contrário, encaminha a carta à igreja como seu instrutor espiritual (Rm 1.13). No capítulo 16 da  carta aos Romanos, Paulo faz 26 saudações aos mais destacados membros da igreja de Roma e não menciona Pedro. Se Pedro já fosse bispo da igreja de Roma há 16 anos (42 d.C. a 58 d.C.), por que Paulo diria: Porque muito desejo ver-vos, a fim de repartir convosco algum dom espiritual, para que sejais confirmados (Rm 1.11)? Não seria um insulto gratuito a Pedro? Não seria presunção de Paulo com relação ao bispo da igreja? Se Pedro fosse papa da igreja de Roma, por que Paulo afirmaria que não costumava edificar sobre o fundamento alheio (cf. Rm 15.20)? Paulo disse isso porque Pedro não estivera nem estava em Roma.

Paulo escreve cartas de Roma e não menciona Pedro. Enquanto Paulo esteve preso em Roma (61 d.C. a 63 d.C.), os judeus crentes de Roma foram visitá-lo e nada se fala a respeito de Pedro, visto que os judeus nada sabiam acerca dessa seita que estava sendo impugnada. Se Pedro esteve lá, como esses líderes judeus nada sabiam sobre o cristianismo (At 28.16-30)? Paulo escreve várias cartas da prisão em Roma (Efésios, Filipenses, Colossenses, Filemon) e envia saudações dos crentes de Roma às igrejas sem mencionar Pedro. Durante sua segunda prisão, Paulo escreveu sua última carta (2 Timóteo) em 67 d.C. Paulo afirma que todos os seus amigos o abandonaram e apenas Lucas estava com ele (2 Tm 4.10,11). Pedro estava lá? Se estava, faltou-lhe cortesia por nunca ter visitado e assistido Paulo na prisão.

Não há nenhum fato bíblico ou histórico em que Pedro transfira seu suposto papado a outro sucessor. Não apenas está claro à luz da Bíblia e da história que Pedro não foi papa, como também não nenhuma evidência bíblica ou histórica de que os papas são sucessores de Pedro.

Ainda que Pedro tenha sido o bispo de Roma, o primeiro papa da igreja (o que é fartamente negado com irrefutáveis provas), não temos provas de que haja legítima sucessão apostólica; e, se houvesse, os supostos sucessores deveriam subscrever as mesmas convicções teológicas de Pedro. Dessa forma, o catolicismo romano defende e prega doutrinas estranhas às Escrituras, que bandeiam para uma declarada apostasia religiosa. Assim, é absolutamente incogruente afirmar que o papa possa ser legítimo sucessor de Pedro, quando sua teologia e sua prática estão em flagrante oposição ao que apóstolo Pedro creu e pregou. Pedro condenou o que os papas aprovam.

 

Pr Marcelo Oliveira

Bibliografia: STOTT, John. A mensagem de Atos. Editora ABU

                    LOPES, Hernandes Dias. O papado e o dogma de Maria. Ed. Hagnos

                    WIERSBE, Warren. Comentário Expositivo. Geográfica Editora

 

Rufo, era eleito? Em que sentido?

Quem é o Rufo de Romanos 16.13 a quem Paulo recomenda saudações dizendo: “Saudai Rufo, eleito no Senhor, e igualmente a sua mãe, que também tem sido mãe para mim”? Seria esse o mesmo Rufo filho de Simão Cireneu (o que foi forçado a carregar a cruz de Cristo) e irmão de Alexandre, mencionado pelo evangelista Marcos (Mc 15.21)? A tradição cristã corrobora com essa possibilidade e a maioria dos comentaristas bíblicos também não a descarta. Segundo Hendriksen, “a opinião popular, cuja data recua aos primeiros séculos, de que as duas fontes se referem ao mesmo indivíduo, é possível que seja correta. No entanto, não podemos ter certeza”.[1]

Embora não possamos afirmar com exatidão que o Rufo de Marcos 15.21 seja o mesmo de Romanos 16.13, também não há prova contrária de que não possa ser. De acordo com Bruce, Rufo é um “nome de origem itálica, e não tanto latina, encontrado por duas vezes no Novo Testamento (Mc 15.21; Rm 16.13), provavelmente referindo-se ao mesmo indivíduo”.[2] Marcos, que com toda probabilidade escreveu seu Evangelho em Roma para os romanos[3], menciona “Simão Cireneu… pai de Alexandre e Rufo” como se dissesse: “pessoas que vocês, em Roma, conhecem bem”.[4] Paulo, que também escreveu aos romanos, coincidentemente fala de um Rufo que se encontra em Roma.

Considerando que o Rufo de Marcos 15.21 é o mesmo de Romanos 16.13, por que Simão Cireneu não é citado por Paulo? E Alexandre? Não era este tão conhecido pela igreja quanto Rufo? Simão, um judeu do norte da África, possivelmente estava em Jerusalém para a festa da páscoa. Ali conheceu Jesus e toda sua família se tornou cristã. Quando Paulo redigiu sua carta aos romanos, Simão Cireneu devia estar morto, visto que se assim não fosse o apóstolo mencionaria o nome dele quando citou a mãe de Rufo.

Parece que Alexandre era o irmão mais velho de Rufo porque Marcos menciona o nome dele primeiro. Quão mais velho era Alexandre em relação a Rufo é impossível saber. Alguns comentaristas sugerem que Paulo não cita o nome de Alexandre em Romanos 16.13 talvez porque Alexandre já estivesse morto ou não fosse cristão. Prefiro os que dizem que Alexandre era cristão e que, provavelmente, não residia em Roma.

Paulo saúda Rufo com uma das mais belas declarações que um colaborador poderia receber do apóstolo dos gentios: “Saudai Rufo, eleito no Senhor…”. O que significa em Paulo ser alguém eleito no Senhor? Todos sabem que a doutrina da predestinação, ou eleição, é uma das preferidas de Paulo. Somente em sua epístola aos Romanos o apóstolo dedica três capítulos ao assunto (Rm 9-11). Com isso em mente, a Assembleia de Westminster (1643-1649) declarou em sua Confissão de Fé (III,vi): “Assim como Deus destinou os eleitos para a glória, assim também, pelo eterno e mui livre propósito de sua vontade, preordenou todos os meios conducentes a esse fim; os que, portanto, são eleitos, achando-se caídos em Adão, são remidos por Cristo, são eficazmente chamados para a fé em Cristo, pelo seu Espírito que opera no tempo devido, são justificados, adotados, santificados e guardados pelo seu poder, por meio da fé salvadora. Além dos eleitos não há nenhum outro que seja remido por Cristo, eficazmente chamado, justificado, adotado, santificado e salvo”.

Conquanto o conceito doutrinário da eleição seja mercante nos escritos de Paulo, e bem representado na Confissão de Fé de Westminster, ao que tudo indica não é esse o sentido (ou pelo menos não unicamente) do adjetivo “eleito” (ekléktos) em Romanos 16.13. “Eleito” aqui deve ser entendido mais como um título de honra, como o apóstolo faz com Epêneto, Amplíato e Apeles, entre outros, porque, no sentido doutrinário, o que Paulo diz de Rufo pode ser facilmente aplicado a todos os crentes em geral, e aos seus colaboradores de Romanos 16, em especial.

Geoffrey Wilson parece estar correto quando em seu comentário de Romanos 16.13 afirma: “’Eleito no Senhor’ não se refere à eleição para a salvação, pois esta é comum a todos os crentes; significa que ele [Rufo] era um cristão de destaque (cf. Denney: ‘aquele cristão extraordinário)”.[5]

Champlin segue o mesmo raciocínio de Wilson. Diz ele: Eleito “é palavra descritiva de Rufo. Neste caso, o mais provável é que tal vocábulo não deve ser compreendido em qualquer sentido técnico ou teológico, como ‘escolhido por Deus’, embora certamente isso também suceda no seu caso, mas antes, devemos compreendê-lo como uma espécie de sinônimo de ‘eminente’, isto é, distinguido por sua graça, por seu serviço e por sua especial elevação de caráter”.[6] Por conseguinte, a adição de “no Senhor” significaria que Rufo mostrava distinguir-se como crente em Cristo Jesus.[7]

Uma nota carinhosa e singela é a menção de Paulo à mãe de Rufo. A saudação do apóstolo não é dirigida apenas a Rufo, porém, “igualmente a sua mãe, que também tem sido mãe para mim”, diz o apóstolo. Essas palavras sugerem uma profunda afeição de Paulo pela família de Rufo. E esta senhora, com certeza bem idosa e provavelmente viúva na época, é lembrada pelo apóstolo Paulo como uma mãe para ele, por sua importância na vida e ministério dele, tratando-o como um filho seu. “Exatamente onde e quando foi que a mãe de Rufo se fez mãe de Paulo não sabemos. O fato é que aqui, como ocorre com frequência, o apóstolo uma vez mais prova que aprecia o que os membros femininos têm feito e estão fazendo por ele, pessoalmente, e pela igreja, para a glória de Deus”.[8]

Diante do exposto até aqui, a conclusão que chegamos sobre Rufo é que ele era um crente admirável; companheiro leal e um filho excelente. Não é por acaso que o apóstolo Paulo o denominou de “eleito no Senhor”. E você, caro leitor, como acha que Paulo o chamaria se ele vivesse nos dias de hoje?

[1] William Hendriksen, Comentário do Novo Testamento: Romanos. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 669. Itálico do autor.

[2] F. F. Bruce, Rufo. In: O Novo Dicionário da Bíblia. São Paulo, 2003, p. 1418.

[3] Cf. Guillermo Hendriksen, Comentário del Nuevo Testamento: El Evangelio Según San Marcos. Grand Rapids: SLC, 1987, p. 11-27.

[4] Idem, p. 656.

[5] Geoffrey B. Wilson, Romanos: Um resumo do pensamento reformado. São Paulo: PES, 1981, p. 218.

[6] R. N. Champlin, O Novo Testamento Interpretado Versículo por Versículo: Atos/Romanos. Vol. 3. São Paulo: Hagnos, 2002, p. 879. Veja também John Murray, The Epistle to the Romans. Grand Rapids: Wm. B. W. Eerdmans Publishing Co., 1987, p 231. Para um ponto de vista diferente, consulte Hendriksen, op. cit., p. 669.

[7] Ibidem.

[8] Hendriksen, p. 669,70.

Lições da vida de Gideão

INTRODUÇÃO

Gideão surge em Juízes 6.11. Seu nome significa “lenhador” ou “cortador”. Um sentido secundário é “guerreiro”. Surge amedrontado, escondido, sacudindo e limpando trigo. Um anjo o encarrega de libertar o seu povo. De medroso ele passa a libertador. Esta é a primeira lição que aprendemos de sua vida: sem Deus, os obstáculos são enormes. Quando Deus entra em nossa vida, tudo muda. Só o poder de Deus pode transformar radicalmente uma pessoa e todo o seu contexto. A presença de Deus numa vida faz diferença.

1. A SAUDAÇÃO DO ANJO

A vida de Gideão começa a mudar com a apresentação do anjo de Yahweh a ele: “Então, veio o Anjo do SENHOR, e assentou-se debaixo do carvalho que está em Ofra, que pertencia a Joás, abiezrita; e Gideão, seu filho, estava malhando o trigo no lagar, para o pôr a salvo dos midianitas. Então, o Anjo do SENHOR lhe apareceu e lhe disse: O SENHOR é contigo, homem valente” (Jz 6.11-12).

Duas expressões merecem atenção: (1) “O SENHOR é contigo” e “homem valente”. Nenhuma das duas parecia real. Não parecia que o SENHOR estava com Gideão e ele não era valente. Aprendemos algumas lições aqui:

(1) Deus nos vê a nós e a nossa realidade de maneira diferente da que vemos.

(2) Deus está conosco mesmo nos momentos em que não nos parece estar.

(3) Deus vê potencial em nós, potencial que nem nós mesmos enxergamos.

Somos pecadores, mas mesmo com os efeitos da Queda, somos imagem e semelhança de Deus. Temos potencial, arranhado pela Queda e maculado pelas nossas limitações. Mas a Graça (Graça é Deus vindo a nós) nos socorre e nos capacita para tarefas e missões que ele nos outorga.

2. A DÚVIDA E A RESPOSTA

Está em 6.15-16: “E ele lhe disse: Ai, Senhor meu! Com que livrarei Israel? Eis que a minha família é a mais pobre em Manassés, e eu, o menor na casa de meu pai. Tornou-lhe o SENHOR: Já que eu estou contigo, ferirás os midianitas como se fossem um só homem”. Ele externa sua dúvida e sua insegurança. Deus lhe responde que vai usá-lo. A lição aqui é esta: Deus usa os fracos. O mundo cultua o poder e a força. Deus usa os fracos para derrubar os fortes porque ele fortalece a fraqueza dos que usa. Há uma advertência aqui: enquanto foi fraca, a Igreja de Cristo foi poderosa. Quando passou a cultuar o poder e se aliou a ele, ela enfraqueceu. Muitos, na Igreja de hoje, querem a força política, social e econômica. A força da Igreja está no poder de Deus que age nela. Não confundamos as coisas e não amemos o poder humano e secular. Nem ambicionemos poder espiritual. Seja nosso desejo que a glória de Deus se manifeste em nossa vida.

3. ASPECTOS DA VIDA DE GIDEÃO

(1) No tanque de espremer uvas (6.11). Estava trabalhando Deus nunca chamou ociosos. Todas as pessoas que Deus chamou estavam trabalhando. Está correto o provérbio que diz: “Quer que algo seja bem feito? Entregue a quem está ocupado!”. Trabalho não é maldição, mas disciplina e processo pedagógico. O trabalho não foi efeito da Queda, mas surge no Éden, pois o homem foi posto no jardim para trabalhar (Gn 2.15).

(2) Os altares. Há dois altares na vida de Gideão. Um ele fez (Jz 6.22-24). A compreensão de quem é Deus nos leva a erigir altares. Compreender mais de Deus nos leva a cultuá-lo. Traz impacto, reverência, temor. Como em Isaías 6.5 e Lucas 5.8. Nunca percam a reverência. Sejam tementes a Deus e à sua Palavra. O outro altar ele derrubou: Juízes 6.25. A lição aqui: derrube altares dos deuses falsos que se instalam em sua vida (os deuses Dinheiro, Sexo, Poder) e levante um altar ao Deus de verdade.

(3) A porção de lã (Jz 6.36-40). Choca-se com Mateus 4.7? Não. A seriedade de sua missão, que seria a grande missão de sua vida, exigia dele muita certeza. Deus não se ofendeu. Ele conhece nossas limitações. Quando tudo lhe foi confirmado, Gideão não relutou: Juízes 7.1 ( “Então…”). A lição aqui: tem convicção de que a tarefa proposta vem de Deus? Entre com tudo!

(4) Na beira d’água (Jz 7.4-7). Deus queria uma minoria. Estranho! Nós nos impressionamos muito com massa, com multidão. A razão de Deus: Juízes 7.2. As advertências aqui: cuidado com o culto ao homem, cuidado com o culto à organização! Valorizamos técnicas e métodos porque são nossas ações. Chegamos a sacralizar alguns deles como se fossem divinos. O poder está com Deus e o sucesso vem dele. Cuidado com a vaidade!

(5) Sua recusa (Jz 8.22-23). Foi a primeira tentativa de Israel em ter um rei. Ele se recusou a ser rei. Opta pela teocracia e não pela monarquia. O espírito real por trás da monarquia: 1Samuel 8.19-20. É triste quando o povo de Deus quer ser clone do mundo ao invés de ser original. A lição aqui: cuidado com a tentação do domínio. O espírito cristão é de servo, pois este foi o espírito de Cristo (Mc 10.45).

(6) O desastre (Jz 8.27). Tudo aqui é uma lição. Cuidado com o poder religioso! Ele venceu o poder militar e a tentação do poder político, mas cedeu ante a tentação do poder religioso. Este é sutil e muita gente se rende a ele. Sejam auxiliares! Não se ensoberbeçam! Não se envaideçam!

CONCLUSÃO – UMA SÍNTESE DO CARÁTER DE GIDEÃO

Humilde (Jz 6.15), cauteloso (6.17), espiritual (6.24), obediente (6.27), estrategista (7.16-18), conciliador (8.1-3), leal a Deus (8.23), próspero (8.30-31). Parece, pela ordem dos eventos no texto bíblico, que sua prosperidade foi a consequência natural de uma vida dedicada e fiel, que Deus abençoou. Ela não foi sua motivação espiritual. Esta foi servir a Deus.

Gideão é um dos heróis da fé (Hb 11.32). Mas uma brecha o prejudicou. Cuidado com brechas em sua vida. Seja íntegro. Se, eventualmente, surgirem brechas, lembre-se que a Graça é maior que elas. Deus é bondoso e o socorrerá.

Pr. Isaltino Gomes

Mensageiro da Paz: A Páscoa e os 4 cálices

Shalom!

Por infinita graça do Eterno, foi publicado mais um texto de minha autoria, no ótimo jornal – Mensageiro da Paz – orgão oficial da CGADB.  Meus sinceros agradecimentos ao amado amigo e pastor Silas Daniel, editor-chefe do jornalismo da CPAD.  O artigo encontra-se na página 21 da edição de Abril. 

Abaixo o texto na íntegra: 

Numa primeira leitura sobre as dez pragas enviadas contra o Egito, nós deduzimos que a aparente razão para tais calamidades foi a obstinada recusa do Faraó em obedecer à ordem do Eterno de libertar Israel. No entanto, se esse fosse o único propósito, um único golpe devastador teria sido suficiente.

 

Agora surge a pergunta: Por que o Eterno optou por dez pragas? Porque, por intermédio das dez pragas, o Eterno demonstrou não apenas ser o Criador do universo, mas Senhor único e absoluto dos céus e da terra, o Juiz supremo e o Regente da natureza. Segundo a cultura judaica, cada praga que Deus manifestou no Egito serviu como castigo pela escravidão, tortura e a campanha de genocídio perpetrada pelos egípcios contra o povo judeu.

 

O texto de Êxodo 5.1 diz: “[…} para que celebre uma festa no deserto”. Implicitamente esta era a festa da Páscoa. Somente depois que o faraó ter “endurecido o coração” e repetidamente se recusado a liberar o povo judeu, as portas do arrependimento se fecharam. Maimônides, um dos maiores rabinos da história de Israel, explica que a expressão “endurecerei o coração”, é o castigo que Deus impõe a quem cometeu um grave pecado é privá-lo da possibilidade de se arrepender. Este é o significado desta expressão. Percebemos esta ideia no caso de Esaú, que buscou o arrependimento e não encontrou (Hb 12.16,17).

 

As razões naturais que levaram os judeus a incorporar em suas vidas a celebração da Páscoa, no hebraico Pesach (passagem, passar por cima) são relevantes e todas de grande significado. Buscando descortinar os motivos que deram alegria aos judeus em comemorar a Páscoa, devemos observar o capítulo 12 de Êxodo, onde vemos o Eterno não só instituindo tal festa, como também apontando os benefícios dela advindos. Assim, ao celebrar a Páscoa, quer a primeira, quer as que seguiram, o judeu tinha por base quatro grandes bênçãos de Deus, como veremos agora:

 

1) Ela representou o começo de uma nova contagem do tempo.  A partir dessa data o povo deveria, e num certo sentido estava, reiniciando a vida. Isso é magnífico, pois para os judeus a vida era somente opressão, humilhação e opróbrio. Deus queria lhes ensinar algo lindo: a partir deste acontecimento, eles estavam voltando ao zero, e tendo a oportunidade de recomeçar suas vidas.

 

O versículo 2 diz: “este mês será o principio dos meses”. Isto queria dizer que o novo calendário vinha diretamente de Deus e que eles teriam um novo começo. Definitivamente eles abandonariam o calendário da escravidão vivida sob o império egípcio e começariam a contar seus dias a partir do mês da libertação! Nenhuma lembrança deveria acompanhá-los. Houve uma ruptura entre o calendário egípcio e o divino. Hoje pode ser um novo tempo em sua vida. Não haverá lembrança dos tempos antigos. Deus estava dizendo ao povo judeu: chega de escravidão, hoje faço uma ruptura no calendário antigo.

 

O profeta Isaías alça sua voz e diz: “Eis que faço uma coisa nova, agora sairá a luz” (Is 43.19).

 

2) De escravos, foram feitos em homens e mulheres livres.  A segunda razão da alegria de celebrar a Páscoa estava no fato de que o povo seria livre. Tente imaginar: os judeus estavam confinados aos estreitos limites da terra da escravidão, e sem nenhuma condição de se moverem daquele território. Agora, por causa da Páscoa, seriam livres para andar sob a direção de Deus. A chance de ver-se livre das amarras do escravizador era iminente.

 

Os judeus celebravam a Páscoa sob a ótica da liberdade. Como uma autêntica carta de alforria, a Páscoa proclamava liberdade aos cativos. Assim éramos nós, escravos do pecado, confinados nele, mas por meio do sangue de Jesus, somos livres!

 

Jesus disse: “Se o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres” (Jo 8.36). O apóstolo Paulo, em Romanos 6.18 diz: “E libertos do pecado, fostes feitos servos da justiça”.

 

3) Foram guardados diante do juízo de Deus.  Sob o efeito protetor do sangue do Cordeiro pascal, o povo judeu foi preservado da morte que atingiu todas as famílias egípcias. A morte que fez definhar o poderio egípcio, pois desde o rei ao mais simples cidadão, bem como os animais, todos tiveram de chorar aquela noite a perda do seu primogênito, mas a família dos judeus não foi atingida.

 

Ao ver toda a família presente no banquete pascal, é possível imaginar a enorme alegria que tomou conta do coração do judeu. Assim, a Páscoa não comunica somente o começo de um tempo novo e a liberdade, mas também a vida guardada diante da morte.

 

A cultura judaica é uma das mais fascinantes do mundo. Os judeus até hoje celebram a Páscoa com quatro cálices. Neste momento você deve estar se perguntando: De onde veio a ideia dos quatro cálices? Os exegetas judeus observaram um detalhe interessante no livro do Êxodo 6.6,7 onde há quatro verbos que se destacam.

 

“Portanto, dize aos filhos de Israel: Eu o Senhor, vos tirarei [1] de debaixo das cargas dos egípcios, e vos livrarei [2] da servidão, e vos resgatarei com braço estendido [3] e com grandes juízos.  Versículo 7: Eu vos tomarei [4] por meu povo […]” (Ex 6.6,7).  Eles também relacionam estes quatro verbos as quatro letras do nome inefável do Eterno, o tetragrama sagrado: Yod, Hei, Wav, Hei. 


A Palavra de Deus é um livro incomparável e magnífico. No evangelho de Lucas 22, temos quatro cálices também!

 

Vejamos:

 

Lucas 22.17: E, tomando um cálice [1]

Lucas 22.20: Semelhantemente, tomou o cálice [2]

Lucas 22.42: “[…} passa de mim este cálice [3]

Lucas 22.18: “[…] não beberei do fruto da vide [4]

 

Perceba que os cálices no texto de Lucas não estão em uma ordem cronológica. O versículo 18 aponta para o cálice que “beberemos” por ocasião  das bodas do Cordeiro.

 

Agora, o que desejo destacar, é o 3º cálice, em que encontramos o verbo: “resgatarei com braço estendido”. Esse foi o cálice que Jesus, o Filho de Deus, pediu ao Pai para que ele não tomasse, quando orava no Getsemani. Todavia, sabemos que o Pai não ouviu sua oração. Jesus teria que sorver toda a ira de Deus e levar sobre si os pecados do mundo. Surge a pergunta: “Onde Jesus tomou este cálice”? Na cruz, com o braço estendido! Ele nos resgatou com braço estendido! Oh profundidade das riquezas! É por este motivo que devemos amar e estudar a Bíblia. Ela é perfeita, bela, incomparável.

 

4) Eles tinham como destino uma terra abençoada. Para um povo que viveu tanto tempo sem uma pátria, a Páscoa prometia uma terra rica, abençoada sob o governo redentor de Deus. O texto de Êxodo 12.25 diz: “E acontecerá que, quando entrardes na terra que o Senhor vos dará…”. Mais tarde, Josué disse: “E eu vos dei a terra em que não trabalhaste, e cidade que não edificaste, e habitais nela e comeis das vinhas dos olivais que não plantaste” (Js 24.13).

 

Assim, tendo reiniciado a contagem dos dias, experimentando a liberdade, guardados do poder destruidor da morte e indo em direção a uma terra rica, não é de admirar que a Páscoa tinha um clima de festividade indizível. Contudo, há de se observar que a celebração da Páscoa não tinha como objetivo centralizar a atenção do povo nas bênçãos que lhe foram outorgadas, mas no Deus Eterno, que era a fonte de tudo e os abençoara. 

 

Assim como o povo de Israel entrou na terra da promessa, nós, que conhecemos a Jesus, o Cordeiro de Deus, e reconhecemos seu senhorio, entraremos na Jerusalém celestial, a cidade cujo arquiteto é o próprio Deus. Amém!

 

Pr Marcelo Oliveira – Teólogo. Pós graduado em AT.  Conferencista. Hebraísta. Escritor. Membro da Academia Evangélica de Letras do Brasil. 

 

Paulo, homem

 

A Bíblia apresenta vários exemplos de homens e mulheres de Deus que passaram por momentos de fraqueza e abalo emocional. Numa época em que muitos se apresentam como supercrentes e falsas teologias enganam tanta gente, que tal aprendermos algo mais com um deles?

 

A tristeza de PauloEm sua epístola aos Romanos, o apóstolo Paulo descreve como se sentia em relação à incredulidade de seus compatriotas judeus: “Digo a verdade em Cristo, não minto, testemunhando comigo, no Espírito Santo, a minha própria consciência: tenho grande tristeza e incessante dor no coração; porque eu mesmo desejaria ser anátema, separado de Cristo, por amor de meus irmãos, meus compatriotas, segundo a carne” (Rm 9.1-3).[1] Aos coríntios ele diz que não se apresentaria a eles como da primeira vez, ou seja: “Isto deliberei por mim mesmo: não voltar a encontrar-me convosco em tristeza” (2Co 2.1). No entanto, é provável que a mais impressionante passagem bíblica sobre tristeza de Paulo tenha sido em prol de Epafrodito, seu colaborador na igreja de Filipos: “Com efeito, adoeceu mortalmente; Deus, porém, se compadeceu dele e não somente dele, mas também de mim, para que eu não tivesse tristeza sobre tristeza. Por isso, tanto mais me apresso em mandá-lo, para que, vendo-o novamente, vos alegreis, e eu tenha menos tristeza” (Fp 2.27,28). “(…) os crentes filipenses e o próprio apóstolo sentiriam profundamente a perda daquele fiel servo de Deus. (…). Vemos, pois, que Deus respeita os sentimentos humanos corretos, o que não é uma bênção pequena”.[2]

 

O medo de PauloO apóstolo Paulo já vinha sofrendo várias ameaças e perseguições em sua obra missionária. Foi assim em Damasco, Jerusalém, Antioquia da Síria, Icônio, Listra, Filipos, Tessalônica, Beréia, como em tantos outros lugares que ele ainda passaria. Contudo, é em Corinto que o medo do apóstolo fica evidente, a ponto de Lucas relatar: “Teve Paulo durante a noite uma visão em que o Senhor lhe disse: Não temas; pelo contrário, fala e não te cales; porquanto eu estou contigo, e ninguém ousará fazer-te mal, pois tenho muito povo nesta cidade. E ali permaneceu um ano e seis meses, ensinando entre eles a palavra de Deus” (At 18.9-11). Algo semelhante foi dito por Deus ao jovem Jeremias: “Não temas diante deles, porque eu sou contigo para te livrar, diz o SENHOR” (Jr 1.8; cf. 1.19). Em sua primeira epístola aos CoríntiosPaulo declara: “Eu, irmãos, quando fui ter convosco, anunciando-vos o testemunho de Deus, não o fiz com ostentação de linguagem ou de sabedoria. Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo e este crucificado. E foi em fraqueza, temor e grande tremor que eu estive entre vós” (1Co 2.1-3). “Os termos temor tremor estão relacionados às inúmeras ameaças políticas e sociais que Paulo teve de enfrentar”.[3]

 

O desencorajamento de PauloNão é o mesmo que covardia, mas abatimento da alma. O desencorajamento deste gigante da fé aparece após ele ser preso em Jerusalém e fazer sua defesa perante o povo e o Sinédrio. “Na noite seguinte, o Senhor, pondo-se ao lado dele, disse: Coragem! Pois do modo por que deste testemunho a meu respeito em Jerusalém, assim importa que também o faças em Roma” (At 23.11). Estava Paulo deprimido, desanimado e apreensivo com que o aguardava pela frente? A palavra de ordem “Coragem!” sugere tudo isso. “Jesus usou esse termo [coragem] muitas vezes durante seu ministério terreno. Por exemplo, quando andou sobre as ondas do lago da Galiléia e os discípulos ficaram cheios de medo, ele lhes disse que tivessem coragem (Mt 14.27; Mc 6.50). Aqui em Jerusalém, Jesus encoraja Paulo a ser destemido”.[4] Uma experiência de abatimento semelhante a de Paulo foi vivida por Josué, o sucessor de Moisés. O Senhor falou a Josué e o animou (Js 1.1-9). David Livingstone, após sofrer um ataque de leão numa de suas jornadas na África, disse que sua motivação em continuar na obra missionária era a promessa de Jesus: “… E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século” (Mt 28.20).[5]

 

O desespero de PauloEm sua segunda epístola aos Coríntios o apóstolo diz: “Porque não queremos, irmãos, que ignoreis a natureza da tribulação que nos sobreveio na Ásia, porquanto foi acima das nossas forças, a ponto de desesperarmos até da própria vida” (2Co 1.8). Paulo nunca escondia suas fraquezas, pelo contrário, ele não queria que os irmãos ignorassem a natureza das tribulações que vieram sobre ele e aos demais missionários na Ásia. Bem diferente dos “apóstolos” defensores da Confissão Positiva que afirmam que se um crente sofre e se desespera é porque não tem fé em Deus ou está em pecado. Muitosdesses modernos fariseus quando ficam doentes inventam mentiras somente para não aparecer debilitados em público e, assim, contradizer a falsa doutrina que eles defendem. “O risco que Paulo correu foi tão grande que ele o descreve como um fardo extremamente pesado que ele não era capaz de suportar fisicamente. Mais do que isso, espiritualmente lhe faltava a força necessária e ele entrou num estado de desespero (contrastar com 4.8). Ele já esperava o fim de sua vida terrena a não ser que o próprio Deus interviesse e, por assim dizer, o trouxesse de volta dos mortos”.[6] Deus não nos promete um caminho suave, mas garante nossa chegada segura.

 

 Pr. Josivaldo F.  Pereira 

 



[1] Cf. William Hendriksen, Comentário do Novo Testamento: Romanos. São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 407-09; F. F. Bruce, Romanos: introdução e comentário. Série Cultura Bíblica. 4ª ed. São Paulo: Vida Nova/Mundo Cristão, 1986, p. 148.

[2] Cf. R. N. Champlin, O Novo Testamento interpretado versículo por versículo. Vol. 5. São Paulo: Hagnos, 2002, p. 41. 

[3] Simon Kistemaker, Comentário do Novo Testamento: 1Coríntios. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 112. Para um ponto de vista diferente, consulte Leon Morris, 1Coríntios: introdução e comentário. Série Cultura Bíblica. São Paulo: Vida Nova/Mundo Cristão, 1992, p. 41.

[4] Simon Kistemaker, Comentário do Novo Testamento: Atos. Vol. 2. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 426.

[5] Veja esta mesma certeza de Livingstone expressa em uma de suas cartasem W. Garden Blaike, The personal life of David Livingstone. New York, Chicago And Toronto: Fleming H. Revell Company, 1880, p. 497,98.

[6] Simon Kistemaker, Comentário do Novo Testamento: 2Coríntios. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 74. Consulte também Colin Kruse, 2Coríntios: introdução e comentário. Série Cultura Bíblica. São Paulo: Vida Nova/Mundo Cristão, 1994, p. 70.


 

Como assim: “Deixe aos mortos enterrar seus mortos”?

As palavras de Jesus registradas em Mateus 8.22 e Lucas 9.60, são consideradas ásperas e muitas vezes mal compreendidas: ” […] deixa aos mortos enterrar seus mortos”. Esses evangelhos colocam as palavras num contexto em que certos discípulos explicam o porquê de não poderem deixar de imediato suas respectivas situações e seguir a Jesus.  Nesse exemplo específico, um discípulo pediu permissão para ir primeiro enterrar seu falecido pai. Conforme entendido pelos leitores modernos, a aparente negativa de Jesus mostra-se um tanto irracional quanto desnecessariamente severa. Alguns comentaristas tentam atenuar a declaração, interpretando-a como “deixe os espiritualmente mortos enterrarem os fisicamente mortos”, mas isso iria contradizer o quinto mandamento da lei mosaica, que diz: “Honra teu pai e a tua mãe …” e a responsabilidade judaica de providenciar um sepultamento apropriado conforme ordenado em Dt 21.22,23

Todavia, quando interpretados à luz da informação arqueológica concernente às práticas de sepultamento do 1º século judaico, o pedido do discípulo e a resposta de Jesus podem ser vistos sob uma ótica diferente. O enterro judaico no tempo de Jesus consistia de dois sepultamentos e [o segundo] acontecia pelo menos um ano depois. O primeiro conhecido como “ser reunido aos seus pais”) era dentro da cova da família, seguido por um período de pranto.  O segundo era dentro de uma caixa de ossos (ossuário), geralmente com os resquícios de outros membros da família, quando a carne estava decomposta. O que parece estar em foco no registro do evangelho é o segundo sepultamento (conhecido como ossilegium). A réplica de Jesus ao discípulo que desejava uma licença de 11 meses antes de iniciar o serviço não se referia apenas à prolongada ausência, mas especialmente ao aspecto não bíblico do segundo sepultamento. 

O sepultamento imediato (“reunir-se aos seus pais”) é retratado na Bíblia (cf. Gn 49.29; Jz 2.10; 16.31; 1 Rs 11.21,43), mas nos tempos do Novo Testamento esse conceito havia adquirido um outro significado teológico. De acordo com as fontes rabínicas, o ato de decomposição tinha um efeito purificador, fazendo a expiação pelos pecados do falecido. A consumação desse processo espiritual era o ritual do segundo sepultamento. Uma vez que Jesus  seguia o ensino bíblico de que somente Deus faz expiação (sobre a base da fé na redenção sacrifical), sua declaração corrigia essa prática imprópria. Poderíamos então interpretar as palavras em Lucas 9.60 […] como: 

“Olhe, você já honrou seu pai dando-lhe um sepultamento apropriado na tumba da família. Agora, ao invés de esperar que a carne se decomponha, o que não pode expiar o pecado, vá pregar o evangelho do reino de Deus […] o único meio de expiação. Deixe os ossos dos ancestrais do seu falecido pai reunirem-se aos dele no ossuário! Quanto a você, siga-me!” 

Pr Marcelo de Oliveira 

Cristo não voltará tão cedo!

“Que horror! Como pode um pastor dizer isto?”, perguntará alguém.

Uma coisa é desejar algo. Outro é saber que este algo acontecerá. Por isso, antes de criticar, leia com atenção.

Muitos intérpretes anunciam a volta iminente de Cristo com base em seu sermão profético sobre o fim da atual ordem: guerras, terremotos, fome, pestes, imoralidade, etc. Sem exceção, todos estes sinais estiveram presentes ao longo da história! Sobre eles, Jesus disse: “Ainda não é fim!” (Mt 24.6). Eles são “o princípio das dores” (Mt 24.7). O que marcará o tempo do fim não são sinais deste tipo, mas outro: “E será pregado este evangelho do reino por todo o mundo, para testemunho a todas as nações, então virá o fim” (Mt 24.14).

Agora ponde pondere estes dados:

1) Cerca de 62% da renda mundial pertence aos cristãos, em cujas mãos está também a mais moderna tecnologia.

2) Desses cristãos, 2/3 são nominais e apenas 1/3 são evangélicos. Isto significa que 24% da renda mundial estão nas mãos dos evangélicos.

3) Dos dízimos e ofertas que as igrejas recebem, elas utilizam assim estes recursos:

3.1) Gastam 95 a 99% com suas estruturas, organizações, construção, festas, veículos, etc.

3.2) Gastam 0,9 a 4,9 em evangelização em locais onde já há igrejas.

3.3) Gastam 0,1 a 0,9 com povos onde não há igrejas.

4) O total de povos não alcançados é de 11.000 (onze mil). Pretendemos alcançá-los com 0,1 a 0,9 de nossas entradas, e gastamos mais de 90% conosco mesmo.

5) Os muçulmanos investem na islamização do mundo. Empregam 10% de sua renda para as mesquitas, 2,5% para projetos de islamização mundial, e para o mesmo fim destinam 5% da produção agrícola e têm uma taxa de 10% sobre produtos importados (quase tudo que eles têm é importado).

Para cada pessoa que se converte ao cristianismo em geral, não apenas à fé evangélica, sete se convertem à fé muçulmana. O norte da África é quase que todo muçulmano. Há imensas mesquitas na Europa, Estados Unidos e Brasil. Os evangélicos estão preocupados com igrejas “onde se sintam bem”, e com sua vida pessoal à parte do evangelho. “O segredo meu sucesso é Jesus”, alguns deles colocam em seus carros. Mas nada fazem por missões mundiais. Jesus é para fazê-los ter coisas, e não para ser pregado ao mundo. Outros nada acrescentam e apenas criticam a igreja, o evangelho e seus irmãos.

À luz disto, e sabendo que há tantos evangélicos absolutamente omissos no envolvimento com o reino de Deus, você acha mesmo que Cristo voltará em breve, faltando 11.000 povos para alcançar e a igreja olhando mais para si mesma que para a evangelização do mundo?

Pr Isaltino Gomes 

 

O Seder de Pesach

A refeição da noite de Páscoa, a mais solene e a mais rica entre todas as refeições hebraicas, acentua três momentos particulares: 1) a ceia real e propriamente dita realizada na abundância e na alegria; 2) um longo momento simbólico-ritual, que a precede, no qual se revive e se explica, sobretudo aos mais jovens, a significação perene da noite pascal; 3) outros momentos simbólico-rituais nos quais prevalece o agradecimento e o canto. A importância desta refeição é tanta, que nela cada parte é atentamente prevista, descrita e motivada. Segundo a tradição judaica estabelece 14 pontos, com uma fórmula mnemônica nas quais cada palavra exprime um elemento particular do ritual:

Qaddesh –  É o início da celebração pascal, e consiste em uma berakah pronunciada sobre um copo de vinho, que é bebido no final da oração. Com ela, decalra-se ter chegado o tempo da liberdade, longe da opressão e da escravidão (lembre-se do radical qadosh que significa separar): “tempo da liberdade” expresso pelo copo de vinho e celebrado em todo o período pascal.

Urhas (ablução das mãos) – Lavam-se as mãos, sem entretanto recitar as bençãos comuns, porque a refeição propriamente dita não se inicia logo.

Karpas (sentem-se) – Come-se uma folha de erva molhada no vinagre, como lembrança da amargura da escravidão.

Yahas (dividir) – Pegam-se os três pães ázimos, quebra-se ao meio o que está no centro, pondo uma metade novamente no centro e escodendo a outra metade em qualquer lugar, por exemplo, debaixo da toalha.

Maggid (narrador) – Enche-se um segundo copo de vinho e, antes de bebê-lo narra-se a libertação do Egito, explicando o seu sentido e a atualidade com trechos da Bíblia e com narrações midráxicas, hinos, cânticos e salmos. É a parte mais importante e específica do seder pascal.

Rohsah (ablução) – Lavam-se as mãos com a benção habitual , já que está por iniciar-se a ceia propriamente dita.

Mohsi’ massah (benção dos ázimos) – Abençoa-se o pão como de costume, sendo que desta vez é o pão ázimo, isto é, sem fermento, e come-se um pedacinho.

Maror (erva amarga) – Come-se uma folha de erva amarga com um pouco de haroset, o doce composto de maças rapadas e de nozes recorda como os hebreus, com sua coragem e seu amor pela liberdade, conseguiram mitigar a escravatura egípcia.

Korek (envolver) – Agora come-se uma folha de erva amarga, desta vez, com um pedaço de pão ázimo.

Shulhan ‘Orek (ceia) – È a hora da ceia, que se inicia, tendo como entrada um ovo ou outros alimentos especiais, ricos de conteúdo simbólico.

 Safun (escondido) – Come-se o pedaço de ázimo que estava escondido e que, com um termo de explicação incerta, é chamado de afikoman. Ele é comido em memória do cordeiro pascal, e depois dele é proibido comer qualquer coisa até o dia seguinte. É um momento de particular importância principalmente para os meninos, que são convidados a advinhar onde a metade do pão ázimo está escondida.

Barekh (bênção) – Terminada a refeição, lavam-se as mãos como de costume e se recita a Birkat tradicional há-mazon, enchendo o terceiro copo e bebendo-o no fim.

Hallel (louvor) – Então agradece-se a Deus pela ceia pascal através da qual se reviveu o milagre da liberdade. Enche-se um copo de vinho (o quarto), que se bebe depois de ter recitado os salmos 115-118, chamados de hallel. No fim de tudo abre-se a porta, para favorecer a entrada de Elias, o mensageiro da era messiânica.

 Nirsah (aceitação) – Anuncia-se o final do seder pascal e pede-se a Deus que seja sempre o libertador de Israel.

Pr Marcelo Oliveira