Refutando o Desafio Calvinista ao Evangelho
A doutrina da expiação limitada é provavelmente o ponto mais calorosamente debatido dos cinco pontos do Calvinismo entre os evangélicos. Também é o calcanhar de Aquiles do Calvinismo, sem a qual os outros pontos sucumbem.
Por Roger E. Olson
Tradução: Wellington Mariano
O recente renascimento do Calvinismo entre os evangélicos trouxe à tona o assunto do escopo da morte expiatória de Cristo na Cruz. Muitos cristãos evangélicos simplesmente supõem que Cristo morreu por todos – que Ele padeceu os pecados e sofreu a punição por cada pecador.
Durante os últimos quatros séculos, entretanto, há um relatório minoritário entre os Protestantes. A maioria dos calvinistas, seguidores do reformador francês da Suíça João Calvino (1509-64), ensina que Cristo sofreu a punição pelos pecados dos eleitos – aqueles incondicionalmente predestinados por Deus a salvação. Calvinistas contemporâneos (eles freqüentemente tem predileção pelo termo Cristão Reformado) chamam esta doutrina de “redenção particular” ou “expiação definitiva”.
Entre os atuais evangélicos defensores da expiação limitada estão, mais notavelmente, R.C. Sproul e John Piper. Sproul (1939-) tem sido um apologista evangélico influente e teólogo reformado por grande parte da última metade do século XX. De sua base, Ligonier Ministries, ele participa de programas de rádio, viajou para palestrar em inúmeras conferencias apologéticas e teológicas, e escreveu muitos livros – a maioria dos quais lida com a soberania de Deus a partir de uma perspectiva fortemente reformada.
Piper (1946-), pastor da Minneapolis’ Bethlehem Baptist Church (Igreja Batista Belém em Mineápolis) e fundador do Desiring God Ministries, também viaja extensivamente e fala em grandes encontros de cristãos evangélicos – incluindo as conferências Passion (Paixão) freqüentadas por milhares de principalmente adolescentes da Batista do Sul e jovens na casa dos vinte anos. É um autor prolífico cujos livros, incluindo Desiring God: Confessions of a Christian Hedonist (Desejando Deus: Confissões de um Cristão Hedonista), 1986, vendeu milhões de cópias. Tal como Sproul, Piper é um promotor apaixonado dos cinco pontos do Calvinismo.
calvinismo de 5 pontos
O Calvinismo de 5 pontos é a crença nas doutrinas simbolizadas pelo acróstico da TULIP: depravação total, eleição incondicional, expiação limitada, graça irresistível e perseverança dos santos. Os calvinistas criaram o acróstico por volta de 1913, mas as “doutrinas da graça” que ele representa datam do sucessor de Calvino – Theodore Beza (1519–1605) — reitor da Academia de Genebra (um seminário reformado em Genebra, Suíça, fundado por Calvino). Expiação limitada funciona como o centro deste sistema teológico. Sproul, Piper e muitos outros contemporâneos teólogos evangélicos influentes mantêm e defendem tenazmente esta posição.
expiação limitada
O que expiação limitada ou redenção particular significa? De acordo com Sproul, que prefere chamar esta doutrina de “expiação intencional”, ela significa que Deus intencionou a morte de Cristo na cruz para assegurar a salvação de um número definido de seres humanos caídos – aqueles incondicionalmente escolhidos por Deus. Como outros calvinistas, Sproul argumenta que a morte substitutiva (ex. Deus infligiu em Cristo a punição pelos pecados merecidos por pecadores) foi de valor suficiente para salvar a todos, mas que Deus apenas intencionou a morte de Cristo para salvar os eleitos. No sentido mais importante, Cristo morreu apenas pelos eleitos e não por todos.
Para Sproul (e outros como ele), esta doutrina não é dispensável, ela é parte e parcela do sistema TULIP que eles crêem que seja o único que faça justiça à soberania de Deus e à natureza do dom da salvação. Um argumento que Sproul utiliza, seguindo o teólogo puritano John Owen (1613-83), é que, se Cristo morreu por todos os homens de maneira igual, então todos os homens estão salvos. Afinal de contas, assim o argumento avança, seria injusto de Deus punir os mesmos pecados duas vezes – uma vez que inflige a punição em Cristo e uma segunda vez ao enviar o pecador para o inferno.
Piper é igualmente apaixonado pela expiação limitada. Como Sproul, ele não considera a expiação limitada um ponto menor na teologia. Em um artigo intitulado: “Por quem Cristo morreu? O Que Cristo De Fato Realizou na Cruz Para Aqueles Por Quem Ele Morreu?” 1 Piper argumenta que não é o calvinista que limita a Expiação, mas o não-calvinista que acredita na expiação universal. A razão: aqueles que crêem na expiação universal devem dizer que a morte de Cristo, na verdade, não salvou a ninguém, mas apenas conferiu às pessoas a oportunidade de salvarem a si mesmas. Ou devem abraçar o universalismo.
Piper continua argumentando que Cristo, de fato, morreu por todas as pessoas, mas não da mesma forma. Todas as pessoas se beneficiam da morte de Cristo, por exemplo, recebendo certas bênçãos nesta vida que, caso Cristo não tivesse morrido, eles não receberiam – mas apenas os eleitos recebem o benefício da salvação advindo da morte de Cristo.
A doutrina da expiação limitada é provavelmente o ponto mais calorosamente debatido dos cinco pontos do Calvinismo entre os evangélicos. O teólogo evangélico Vernon Grounds, ex-presidente do Seminário de Denver, atacou fortemente esta doutrina. Fazendo uso de João 1.29; Romanos 5.17-21; 11.32; 1 Timóteo 2.6; Hebreus 2.9 e 1 João 2.2, ele escreveu: “É necessário uma ingenuidade exegética, que é algo senão uma virtuosidade aprendida, para esvaziar estes textos de seu significado óbvio: é necessária uma ingenuidade exegética beirando o sofisma para negar a sua explícita universalidade” 2 Não é necessário dizer que, muitos evangélicos, incluindo alguns calvinistas, consideram tal doutrina repugnante.
BASe para a expiação limitada
Antes de explicar o porquê de esta doutrina ser repulsiva, será benéfico analisar as razões pelas quais muitos calvinistas pensam tão bem acerca dela e a promovem apaixonadamente. Mais uma vez, o que é esta doutrina? É a doutrina que Deus intencionou a morte de Jesus na Cruz para ser uma propiciação (sacrifício substitutivo, expiatório) apenas pelos pecados dos eleitos – aqueles que Deus selecionou para salvar independente de quaisquer coisas que Ele veja neles ou acerca deles (exceto Sua escolha deles para Sua glória e bom prazer).
Por que alguém acreditaria nisso?
Proponentes da expiação limitada fazem uso de várias passagens bíblicas: João 10.15; 17.6 e passagens semelhantes em João 10-17; Romanos 8.32; Efésios 5.25-27; Tito 2.14.
Calvinistas utilizam João 10.15 para suportar seu ensinamento: “Assim como o Pai me conhece a mim, também eu conheço o Pai – e dou a minha vida pelas ovelhas”. Muitos outros versículos em João dizem basicamente a mesma coisa – que Cristo deu a Sua vida por Suas Ovelhas (ex. Seus discípulos e todos aqueles que viriam após eles).
Calvinistas também fazem uso de Romanos 8.32: “Aquele que nem mesmo a seu próprio Filho poupou, antes o entregou por todos nós – como nos não dará também com ele todas as coisas?” Eles presumem que “todos nós” se refere aos eleitos.
Efésios 5.25-27 diz: “Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela, Para a santificar, purificando-a com a lavagem da água, pela palavra, Para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível”. Calvinistas acreditam que esta passagem, como muitas outras, refere-se apenas à igreja como objeto do sacrifício purificador de Cristo.
Em Tito 2.14 está escrito: “O qual se deu a si mesmo por nós para nos remir de toda a iniqüidade, e purificar para si um povo seu especial, zeloso de boas obras”. Calvinistas acreditam que Paulo, o autor da carta a Tito, parece restringir os benefícios salvíficos da morte de Cristo ao “povo seu”, que eles equiparam aos eleitos.
Calvinistas presumem que tais versículos e outros como este ensinam que Cristo morreu apenas por aqueles escolhidos por Deus para a salvação. Mas tais versículos não ensinam as crenças calvinistas. Em nenhum lugar a Bíblia explicitamente ensina esta doutrina calvinista.
Calvinistas enxergam em tais passagens sua crença de que Cristo morreu apenas pela igreja, por Seu povo, por Suas ovelhas. Estes versículos não dizem que Cristo também não morreu pelos outros. E, como veremos, há muitas outras passagens que claramente ensinam que Cristo, de fato, morreu por todos.
Há outra razão pela qual os calvinistas acreditam na expiação limitada. Se Cristo morreu igualmente por todos, afirmam, então todos estão salvos. Argumentam que aqueles que acreditam na expiação universal enfrentam duas opções inevitáveis, mas biblicamente insustentáveis: ou a morte de Cristo salvou a todos ou não salvou a ninguém. Este argumento é, entretanto, falacioso. A expiação universal não exige salvação universal; ela apenas postula a possibilidade de salvação universal.
É possível que os mesmos pecados sejam punidos duas vezes e é isso que torna o inferno tão absolutamente trágico – ele é totalmente desnecessário. Deus pune com o inferno aqueles que rejeitam a substituição de Seu Filho. Uma analogia ajudará a aclarar o que digo. Após a guerra do Vietnã o presidente Jimmy Carter concedeu total anistia a todos os desertores do serviço militar que fugiram para o Canadá e outros lugares. Por decreto presidencial eles estavam livres para retornar ao lar. Alguns retornaram, outros não. O crime que haviam cometido já não era mais punível; mas alguns se recusaram a tirar vantagem da anistia e puniram a si mesmos ficando longe de casa e dos familiares. Os que crêem na expiação universal crêem que Deus permite aos pecadores recusar o benefício da cruz de Cristo para que sofram a punição do inferno apesar do fato de a punição ser totalmente desnecessária.
Talvez o motivo retoricamente mais poderoso a favor da expiação limitada seja o oferecido por John Piper (e outros calvinistas que o precederam) que diz em Por Quem Jesus Cristo Morreu? que aqueles que acreditam na expiação universal “devem dizer” que a morte de Cristo, de fato, não salvou a ninguém, mas apenas deu as pessoas a oportunidade de salvarem a si mesmas. Esta é uma argumentação falaciosa.
Arminianos (aqueles que seguem Jacob Arminius na rejeição da eleição incondicional, expiação limitada e graça irresistível) acreditam que a morte de Cristo na cruz salva a todos que, pela fé, a aceitam. A morte de Cristo assegura a salvação de tais – da mesma forma que ela assegura a salvação dos eleitos no calvinismo. Ela garante que qualquer um que vier a Cristo em fé será salvo por Sua morte. Isto não implica que eles salvam a si mesmos. Isso simplesmente significa que eles aceitam a obra de Cristo em benefício deles.
No outro artigo, teremos a segunda parte deste estudo: RESPONDENDO AO CALVINISMO