O tempo da minha partida – 2 Tm 4.6

A morte para o cristão não é o final da linha. A morte na vida do cristão não tem a última palavra. Depois da morte vem o juízo, quando uns entrarão na bem aventurança eterna e outros serão atormentados eternamente. A morte nivela todos os homens: pobres e ricos, jovens e velhos, doutores e analfabetos. Todos nós viemos do pó e voltaremos a ele. Por outro lado, nem todos terão o mesmo destino após a morte.

O grande paladino do cristianismo, o idoso e surrado Paulo, fechando as cortinas da vida, na ante sala do martírio escreve: “Quanto a mim, estou sendo oferecido como libação, e o tempo da minha partida é chegado” (2 Tm 4.6). O apóstolo Paulo usa aqui um eufemismo para definir a morte para o cristão. Em vez de falar que o tempo de sua morte é chegado, fala do tempo de sua partida. Neste momento vemos a riqueza das línguas originas e sua importância para aclarar muitos textos das Escrituras. A palavra grega usada neste texto é analysys (partida) e esta possui três significados, que veremos agora:

1) Ela significa ficar livre de um jugo.

Esse era o termo usado pelos agricultores em referência ao ato de remover o jugo dos bois. O apóstolo Paulo havia levado o jugo de Cristo, que era suave (Mt 11.28-30), mas também carregou inúmeros fardos em seu ministério (1 Co 11.22; 12.10). Portanto, partir e estar com Cristo significa colocar de lado todos os fardos, pois o seu trabalho na terra estaria consumado. A morte para o cristão é alívio de toda fadiga (Ap 14.13). A morte é descanso (Hb 4.9). A morte é entrar na posse do reino e no gozo do Senhor (Mt 25.34).

A morte para o cristão não é decadência, mas aperfeiçoamento para entrar na glória, na cidade santa, ma Jerusalém celeste. Enquanto estamos aqui, passaremos muitas lutas e sofrimentos. Aqui há choro e dor. Aqui há vales sombrios e trabalhos extenuantes.

2) Ela significa levantar acampamento.

A idéia central aqui é a de desatar as cordas da tenda, remover as estacas e prosseguir a marcha. A morte é colocar-se em marcha. Cada dia dessa marcha é uma jornada que nos aproxima mais do nosso lar. Até que enfim se levantará pela última vez o acampamento neste mundo e se transferirá para a residência permanente na glória. A morte é uma mudança de endereço. A Bíblia diz: “Sabemos que, se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer, temos da parte de Deus um edifício, casa não feita por mãos, eterna, nos céus” (2 Co 5.1). O que o texto está dizendo é que esta casa terrestre é nosso corpo frágil e sujeito ao cansaço, à doença e à morte. Quando esta casa se desmoronar, então, teremos um edifico (no grego: mansão), feita não por mãos, mas eterna nos céus.

Conta-se que um pastor foi visitar um crente no leito de morte. Ao chegar no leito perguntou-lhe: “Meu irmão, como você está”? O irmão enfermo respondeu: “Pastor, a casa onde eu moro está desmoronando, mas eu já estou de malas prontas para me mudar. Estou indo para a casa do Pai”. Dwight Moody, o grande evangelista do século 19, disse na hora da sua partida: “Afasta-se a terra, aproxima-se o céu, estou entrando na glória”.

3) Ela significa desatar as amarras do barco, levantar a âncora e lançar-se ao mar.

A palavra “partida” significa literalmente desatar as amarras de um bote e singrar as águas, atravessando para a outra margem. A morte para o cristão é singrar as águas profundas da vida e chegar do outro lado, na praia áurea da eternidade. A morte para o cristão é ir para o céu (Fp 1.21,23). A morte para o cristão não é fazer uma viagem rumo ao desconhecido. Não é mergulhar na escuridão do sofrimento nem viver perambulando pelo espaço.

A morte para o cristão é preciosa ao Senhor (Sl 116.15). Morrer para o cristão é lucro (Fp 1.21). Morrer é deixar o corpo e habitar com o Senhor (2 Co 5.8). Morrer é bem aventurança (Ap 14.13). Morrer é partir para estar com Cristo o que é incomparavelmente melhor (Fp 1.23). Isso não significa que devemos aborrecer da vida e amar a morte. Não significa que devemos desistir de lutar pela vida e buscarmos os recursos para vivermos bem. Não. O cristão não teme a morte. Ele sabe em quem tem crido. Sua esperança está naquele que disse: “Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo 11.25)

Nele, que venceu a morte e nós também venceremos

Pr Marcelo

Bibliografia: Rienecker, Fritz e Rogers, Cleon. Chave lingüística do N.T – Edições Vida Nova 2007.

6 Responses to O tempo da minha partida – 2 Tm 4.6

  1. Loidy disse:

    Pr. Marcelo! Obrigada pela visita em "meu cantinho". Foi uma honra!
    Li o texto que me sugeriu: As três necessidades de Paulo. Confesso que me tocou profundamente. Em meu coração queima a chama pelas coisas de Deus, sinto que tenho algo para realizar, não sei ao certo exatamente o que é, mas sei que na hora de Deus vai acontecer. Obrigada tbém pelo versículo p/ meditar.
    Que o Senhor continue lhe abençoando e já me tornei sua seguidora.
    Em Cristo,
    Loidy

  2. Anonymous disse:

    Pr. Marcelo, é muito importante mesmo sabermos os significados das palavras utilizadas nos textos bíblicos. Gostei da sua explicação sobre a palavra grega "analysys". Um dos significados, conforme seu estudo, é "livre de jugo". Bem, se for possível, gostaria que você explicasse o significado original da palavra "unção", em Is 8:27 (ARC). Desde já agradeço muitíssimo. Que Deus continue te capacitando a cada dia!

  3. Anonymous disse:

    Não lembro se escrevi a referência correta, então retificando: Is 10:27 (ARC). Obrigado!

  4. Prezamado pr. Marcello de Oliveira,

    Shalom!

    Sempre que escuto, leio e repriso sobre a vida de Paulo, o apóstolo de verdade, me preocupo em tentar ao menos imitá-lo, mesmo que seja, em menor escala. Sim, vou de encontro a dificuldade e a necessidade em amar ao Senhor conforme com certeza, a grande referência na Bíblia, que recebeu a permissão de declarar que devemos ser seus imitadores, como o foi de Jesus Cristo.

    Onde está o ensino básico para que os crentes, hoje, chamados de evangélicos, como forma mais graciosa e permissiva de ser passivo na pregação do Evangelho verdadeiro com as marcas da aflição do amor real que devemos sentir por quem derramou o seu Preciosos Sangue na cruz do Calváriopara a nossa Salvação.

    Hoje, virou mania abreviar o nome do nosso Senhor para o vulgar JC. Sinto vergonha desta afirmação que envergonharia ao nosso Paulo, não na sua morte neste mundo, mas à sua despedida, que deixaria na terra a marca de um homem esmagado pela sua responsabilidade e dedicação.

    Que o nosso Senhor levante alguns paulos nestes últimos dias do Final dos Tempos.

    O Senhor seja contigo, meu nobre amigo!

    pr. Newton Carpintero
    http://www.pastornewton.com

  5. De fato…

    Para um cristão salvo, a morte é o começo da melhor parte.

    Shalom!

  6. Olá, Pr. Marcello.
    Obrigado pela visita no meu blog e pelo comentário.
    Gostei do texto, especialmente pelo viés exegético-hermenêutico.
    Agora já sei de onde também a palavra "análise" veio, com que carga ela representa a partição dos saberes, para qualquer área.
    Ah, as palavras… Que força têm!
    Um abraço,
    André

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *