Hemã, filho de Joel, foi um dos músicos do templo durante o reinado de Davi (1 Cr 6.33; 2 Cr 35.15) e é o candidato mais provável à autoria deste salmo. A segunda opção é Hemã, filho de Maol, um dos sábios durante o reinado de Salomão (1 Rs 4.31). Os termos hebraicos mahalat e leannoth significam “enfermidade” e “para cantar” ou “para humilhar”, respectivamente. É provável que a primeira palavra se refira a uma melodia triste para acompanhar esse cântico melancólico, enquanto a segunda palavra pode identificar o propósito do salmo: nos humilhar diante do Senhor.
Este é o último salmo dos “filhos de Corá” e, talvez, o cântico mais lastimoso de todo o livro. No texto hebraico, o salmo termina com a palavra hoshek, “trevas”, e não encerra com um tom de triunfo, como acontece com outros salmos que começam com sofrimento e perplexidade. Este salmo fala de trevas (vv. 1,6,12,18), da vida à beira da morte (vv. 5,10,11), da sensação de estar afogando (vv. 7,16,17), da solidão (vv. 5,8,14,18) e da prisão (v. 8).
Hemã era um servo de Deus que experimentava sofrimento intenso, sem compreender o motivo de sua aflição. Ainda assim, perseverou em suas orações a Deus e não abandonou a sua fé.
Buscando o ETERNO pela fé (Sl 88.1,2) – A vida de Hemã não havia sido fácil (v. 15), agora, torna-se ainda mais difícil, a ponto de ele sentir que está à beira da morte (vv. 3,10,11). Mas ele não desiste! Continua confiando em Deus, ao qual se dirige como “Senhor”, quatro vezes nesta oração (vv. 1,9,13,14). Iavé é o nome do Senhor que enfatiza sua relação de aliança com seu povo, e Hemã era um filho dessa aliança. Ele também se dirige ao Senhor como “Deus Elohim” – designação que expressa seu poder.
A expressão “Deus da minha salvação” indica que Hemã havia confiado que o Senhor o salvaria, e o fato de orar dessa maneira mostra que sua fé ainda está viva. Em três ocasiões, o texto diz que ele clamou ao Senhor e, para isso, são usadas três palavras diferentes: verso 1 – “um clamor por socorro em meio a grande aflição”; verso 2 – “um grito alto”; verso 13 – “um clamor de angústia”. A oração de Hemã é fervorosa. Ele crê que Deus pode ouvir suas súplicas e fazer maravilhas (vv. 10,12), um Deus que o ama e que é fiel a seu povo (v.11).
Dizer ao ETERNO como nos sentimos (vv. 3-9) – Não há lugar para a hipocrisia na oração pessoal. Um dos primeiros passos para o reavivamento é a mais completa transparência ao orar e a determinação de não dizer ao Senhor coisa alguma que não seja verdadeira e sincera. Hemã confessa que sua alma “está farta de males” e que se sente como um “morto-vivo”. Não tem forças e se sente abandonado pelo Senhor.
Hemã, também diz ao Senhor que Ele é responsável pelos males que aflige seu servo! A mão de Deus o colocou na cova (sheol), e a ira de Deus flui sobre ele como as ondas do mar. Ele não tem riquezas, não tem luz, não tem amigos – e sente como se não tivesse Deus! É um prisioneiro sem qualquer esperança de escapar. Como Jó, Hemã deseja saber o motivo desse sofrimento que lhe sobreveio.
Defender nossa causa diante do ETERNO (vv. 10-14) – O argumento de Hemã é simplesmente de que sua morte privará Deus da grande oportunidade de demonstrar seu poder e glória. Que serventia Hemã teria para o Senhor no sheol? Os espíritos dos falecidos não se levantam no mundo dos mortos para obedecer às ordens do Senhor (cf. Is 14.9-11), mas Hemã pode servir ao Senhor na terra dos vivos (cf. Sl 30.8-10). Antes de ir ao santuário para auxiliar no culto, Hemã ora pedindo que o Senhor conceda restabelecimento e forças, e, no final de um dia atarefado, volta a orar.
Durante seu ministério diário, ouve a benção sacerdotal: “O Senhor te abençoe e te guarde; o Senhor faça resplandecer o rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti; o Senhor sobre ti levante o rosto e te dê a paz” (Nm 6.24-26), mas não recebe! Sente-se rejeitado e sabe que o rosto de Deus não está voltado para ele. Ainda assim, ele continua orando!
Esperar pela resposta do ETERNO (vv. 15-18) – Não sabemos o que foi essa aflição que lhe sobreveio ainda em sua juventude, mas é triste pensar que sofria todos os dias e o dia todo (vv. 15-17). Nem sequer conseguia se lembrar de uma época em que desfrutasse de boa saúde. Os vagalhões que quase o afogam (v. 7) transformaram-se em ondas abrasadoras de tormento (v. 16).
A escuridão é sua amiga, pois o esconde dos olhos daqueles que observam seus sofrimentos e talvez digam (como fizeram os amigos de Jó): “Deve ter pecado grandemente para que o Senhor o aflija de tal modo!”. Mas ele continua orando e buscando o socorro de Deus!
“Embora ele me mate, ainda assim esperarei nele” (Jó 13.15). “Eu creio que verei a bondade do Senhor na terra dos viventes. Espera pelo Senhor, tem bom ânimo, e fortifique o seu coração; espera, pois, pelo Senhor” (Sl 27.13,14). O ETERNO sempre tem a última palavra, e ela não será “trevas”. Quando estamos em trevas, não devemos jamais duvidar daquilo que o Senhor nos ensinou na luz.
Pr Marcello Oliveira
Bibliografia: Kidner, Derek. Salmos 73-150, Introd. e Comentário. Ed. Vida Nova
Agostinho, Santo. Comentário aos Salmos. Ed. Paulus
Wiersbe, Warren. Comentário Expositivo. Geográfica Editora